Cores de Parto – Mia Couto

O que eu vi,

à  nascença, foi o céu.

 

No rasgão da retina,

a desatada luz: o meu segundo oceano.

 

Aprendi a ser cego

antes de, em linha e cor,

o mundo se revelar.

 

O que depois vi,

ainda sem saber que via

foram as mãos.

 

Parteiros gestos

me ensinaram quanto,

das mãos,

a vida inteira vamos nascendo.

 

As mão foram,

assim, o segundo ventre.

 

Luz e mãos

moldaram a impossível fronteira

entre oceano e ventre.

 

Luz e mãos

me consolaram

da incurável solidão de ter nascido.

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