Balada para Maria – Vinicius de Moraes

BALADA PARA MARIA

Rio de Janeiro , 1938

Não sei o que me angustia
Tardiamente; em meu peito
Vive dormindo perfeito
O sono dessa agonia…
Saudades tuas, Maria?
Na volúpia de uma flora
Úmida, pecaminosa
Nasceu a primeira rosa
Fria…
Perdi o prazer da hora.

Mas se num momento cresce
O sangue, e me engrossa a veia
Maria, que coisa feia!
Todo o meu corpo estremece…
E dos colmos altos, ricos
Em resinas odorantes
Pressinto o coito dos micos
E o amor das cobras possantes.

No mundo há tantos amantes…

Maria…
Cantar-te-ei brasileiro:
Maria, sou teu escravo!
A rosa é a mulher do cravo…
Dá-me o beijo derradeiro?
— Cobrir-te-ei de pomada
Do pólen das flores puras
E te fecundarei deitada
Num chão de frutas maduras
Maria… e morangos, quantos!
E tu que adoras morango!
Dormirás sobre agapantos…
— Fingirei de orangotango!

Não queres mesmo, Maria?

No lombo morno dos gatos
Aprendi muita carícia…
Para fazer-te a delícia
Só terei gestos exatos.

E não bastasse, Maria…

E morro nessas montanhas
Entre as imagens castanhas
Da tua melancolia…

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