Autopsicografia, de Fernando Pessoa

Criado em 1931, o breve poema Autopsicografia foi publicado no ano a seguir na revista Presença, um importante veículo do Modernismo português.

Nos apenas doze versos o eu-lírico divaga sobre a relação que mantém consigo próprio e sobre a sua relação com a escrita. Na verdade, escrever no poema aparece como atitude norteadora do sujeito, como parte essencial da constituição da sua identidade.

O sujeito poético ao longo dos versos trata não só do momento da criação literária como também da recepção por parte do público leitor dando conta de todo o processo da escrita (criação – leitura – recepção) e incluindo todos os participantes da ação (autor-leitor).

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Espalhe isto!

Deixe um comentário

Clube do Gueto