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- 8 de setembro de 2019 às 19:37 #5293
*Seguindo a proposta do grupo iniciarei com o trecho de um conto que minha mamãe contava quando eu era um filhote, continuem como puderem*
Já beirava doze meses que o bebê insistia em se manter alojado no ventre da rainha de Castela. Parteiras de todos os cantos eram chamadas para que exorcizassem o fruto que já apodrecia no maldito ventre. O rei, preocupado mais com a possibilidade de ficar sem herdeiro do que com a esposa amofinada propriamente dita, contactava amantes nobres para que o aliviassem do triste fado que o enfadava terrivelmente.
Naqueles tempos a lua só aparecia, atrasada e bêbada, a partir das primeiras horas da madrugada. O sol — não mais deus, não mais pai, mas um vadio filho — levantava ao meio-dia em ponto. Ninguém conseguia ver que imagens formavam as nuvens, pois, de fato, mais do que nunca, as nuvens apenas se pareciam com elas mesmas: neutras e estéreis.
Alinhada com as polêmicas naturais estava a barriga enorme da rainha de castela. Misto de globo e aquário, o bucho, cada dia que passava, ficava mais e mais transparente…
*continuem daí galera! mordidelas da cadela para todos vocês*
10 de setembro de 2019 às 18:21 #5586Por aqueles tempos, a Rainha da Saxônia apareceu em comitiva para visitar a corte de Castela, o alvoroço que se formou aos portões da muralha era de vivas à Rainha e ao grande reino Saxão. Mas, como se sabe, o povo é tolo em suas extremadas demonstrações de afeto. A velha fidalga assomou à portinhola da nobre carruagem, relanceou com olhos chispantes a patuleia em volta, e, com seu nariz em riste, avançou por um longo tapete vermelho, escoltada por sua armada de guardas reais. Seus anéis pesados de pedras cintilantes, suas joias de soberba riqueza, a coroa no ápice da estatura, tudo dava a ver o poderio de sua realeza. A Rainha de Castela, mesmo debilitada, amparada pelo braço forte do Rei, aguardou no centro da nave palaciana a velha fidalga aparecer. As luzes iridescentes das tochas tornavam o cair da tarde em um fabuloso jogo de luz e sombra, talvez medonho, porém de primorosos detalhes. A rainha da Saxônia, vestida ricamente em dourado e adornada com joias de cinco séculos, e uma grande e alta coroa ouro coberta de diamantes, estacou em seu passo aligeirado com a vista que lhe surgiu! Então, parada e fria, com olhar direto e gélido em direção à jovem Rainha de Castela, a velha deixou-se estar alguns momentos em deleitoso delírio, talvez fosse a expressão esmaecida, macilenta e um tanto esverdeada da jovem.
10 de setembro de 2019 às 18:37 #5588… Mas sua surpresa era devido, principalmente, a indecorosa amplitude do ventre daquela rainha a qual era sua mui prelada amiga. O longo camisolão típico das grávidas e convalescentes não lograva esconder o umbigo dilatado que mais parecia um rabinho de porco. Um temporal se formava desde cedo. O povo fazia comentários em voz alta “O sol ainda nem apareceu, e se essa chuva arriar aí que vai fica difícil de mais tardar o tempo ficar bom” A fidalga cumprimentou a escassa cômitiva real que veio ao seu encontro, despachou os lacaios mal educados e os nobres aborrecidos que tinha trazido consigo e foi direcionada por criados amáveis, embora um tanto nervosos com os últimos acontecimentos, até seus aposentos. Haveria um jantar naquela noite. Naturalmente, com a mudança repentina no céu opaco e difuso genuinamente casteleano, a rainha da saxônia estava aturdida e preocupada. Enquanto retirava seus magníficos diademas e sua peruca esmaltada em prata, a fidalga, que era, por assim dizer, uma puta velha, já tinha percebido tudo.
Mal tinha podido articular algumas palavras de saudação com os dois, mas percebeu que o rei estava traindo a senhora de Castela. Ajudava sua própria esposa sem convicção e de muita má vontade, a ausência dele era mais ofensiva do que todas aquelas presenças pálidas e ávidas de atenção: a nobreza falida.
A rainha da saxônia teve de interromper o julgamento inapelável de seu foro íntimo para fechar as janelas…10 de setembro de 2019 às 18:43 #5589Apesar da impressão negativa e certeira da fidalga a cerca do rei, ela desconhecia a verdade.
No outro extremo do palácio, num aposento contíguo ao da rainha de Castela, o som claudicante de uma espineta infantil quebrava o silêncio em mil ruídos divinos. Tendo o estranho dom de ser uma virtuose em instrumentos musicais de brinquedo, o rei encantava aos leigos em matéria musical e despertava a ira dos legítimos solistas, regentes e mestres.
Ora vejam só — diziam os entendidos no assunto — ele é apenas um diletante, e dos mais tronchos! Aqueles que o cercam afetam delírios, batem palmas e lhe salpicam elogios unicamente pelo fato dele ser rei de Castela, caso contrário nunca dariam tamanha importância a estas declaradas parlapatices!
Entretanto — e isto era inegável até para os que torciam o nariz, a boca e o rabo para os dotes do rei — as flautas doces feita para jovens imberbes , os violinos produzidos com madeira verde provinda dos abetos dos bosques de Viena e a espineta importada diretamente da famosa fábrica de brinquedos de Nuremberg, enfim, todos os artigos musicais voltados para o simples divertimento dos pequenos acabavam por ganhar status de grandeza nas mãos do mavioso rei de castela.
Ele estava justamente pensando na rainha da Saxônia quando notou a escuridão pela vidraça da janela.
“e ainda nem é meio dia” pensou, e logo após ouviu um grito vindo de onde estava alojada a sua esposa “morre não morre”.10 de setembro de 2019 às 19:01 #5591Era a tia perneta da rainha de Castela, até então calada desde a morte de seu marido Eustáquio III. Cansou do lenga-lenga se levantando da cadeira, tirando do seu bolsão uma faca…
- Esta resposta foi modificada 5 anos, 2 meses atrás por Jean F..
30 de outubro de 2019 às 00:23 #6485…sem ponta, ameaçando a integridade do suculento pão olvidado sobre o criado-mudo da rainha. Os cortesões presentes espantaram-se com aquilo: excetuando os grunhidos e as risadinhas dada pela velha após soltar seus sonoros e insuspeitos peidos, nunca ouviram tal demonstração originária das cálidas cordas vocálicas daquela mulher penitente e severa.
Em sua juventude, esta velha tia perneta havia sido uma jovem cantora que seduzia e abria a porta de qualquer gentil coração ao entoar suas notas claras para a audiência indolente dos bosques. Se os homens, ao escuta-lá, quedavam-se apaixonados, os pássaros desprezavam a pueril e casta jovem. Certo dia combinaram maléfico e ousado plano, invejosos e despeitados reuniram-se em bando e, pousados nos galhos de cúmplices árvores frondosas, aguardaram a despreocupada moça aparecer para sua cantata matinal. A emboscada surtiu efeito terrível: nem bem a loura despontou com seu pontudo instrumento olfativo em riste, os pássaros aglutinados saíram das tocais e atacaram a ingenua donzela. Bicaram-na até deformarem-lhe totalmente a cabeça e só não a assassinaram por que, no desespero de se ver livre daquele assalto inconcebível à sua pessoa, a jovenzinha correra atarantada chegando, afinal, a tropeçar e cair num buraco de mais de cinco palmos de profundidade. Os pássaros deram-se por satisfeitos com a aplicação daquele susto superficial na moça e resolveram deixa-lá em paz.
Um grupo de galantes rapazes passeava pelos arredores onde jazia o corpo fustigado da jovem. Deparando, por fim, com aquela lastimável cena, os estouvados nobres julgaram tratar-se de uma feiticeira abusada pelo diabo. Alarmaram-se. Nenhum reconhecia naquela figura trôpega e repleta de mondrongos pavorosos pela cabeça a jovem de bela voz e alegres gestos com quem tanto flertavam nas saídas e festas da igreja.
“Irmãos — assim começou o mais velho dentre eles — eis nossa oportunidade de conhecer o belo e frágil sexo antes do fatídico casamento. A maioria de nós já está prometido para uma nobre e tediosa dama que é mais fogosa por gatos de rua conquanto frugal com os mais belos e viris príncipes que sua casa poderia atrair o dote. Aproveitemos esta carne macia que a terra nos fornece, lembrem-se do provérbio: o refugo deixado por satã é o presente que Deus oferece!”
Ao terminar seu discurso esdruxulo, foi até a criatura desacordada, despiu-lhe a roupa suja de terra e…
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